Concedi recentemente uma entrevista sobre o vestibular da UFRN para a Tribuna do Norte. Naturalmente, para publicar eles tiveram que editar algumas partes em virtude da pouca disponibilidade de espaço. Segue abaixo a entrevista, na íntegra:
1 - A grande surpresa na relação de demanda divulgada pela Comperve da UFRN foi o novo curso de Design, cuja procura foi de 14 candidatos por vaga, a segunda maior. O que poderia explicar isso?
Já a algum tempo o design de produtos tem sido um diferencial forte na escolha do consumidor. Num contexto de preços semelhantes, serviços semelhantes, funcionalidades bem parecidas, o design fascina o consumidor - desperta seus desejos. É só lembrar das decisões de compra a respeito de telefones celulares, carros ou ainda eletrodomésticos. Há uma demanda reprimida no mercado nacional e local por bons designers, com formação superior.
2 - E quanto ao de Publicidade e Propaganda que também se destacou (8,98), com a demanda mais alta entre todos de Comunicação Social? Essa área promete, ou talvez tenha sido apenas coincidência?
As agências de propaganda são um mercado em efervescência em Natal. Há necessidade de profissionais que aliem talento, criatividade a uma formação mais consistente. De uns tempos para cá o mercado publicitário local tem alcançado um nível de profissionalismo bem maior. Está em extinção aquele perfil de profissional que não tem formação, que se acha criativo e que se auto intitula publicitário. Outro ponto a acrescentar na publicidade é a possibilidade real de empreender, abrindo agências, o que - comparado a outros tipos de negócios, requer um investimento menor e apresenta riscos menores.
3 - Por outro lado, opções novas como a de Letras - Espanhol, registrou demanda de apenas 2,5 na capital e menos de um por vaga no Seridó. Ainda falta ao alunado despertar para a importância do estudo de línguas no futuro próximo, ou até mesmo já no presente?
Poderíamos atribuir essa realidade à pura falta de informação. Acho que o marketing em torno da profissão não tem conseguido mostrar a grandeza de opções que se abre para um profissional de letras. Muita gente acha que o curso só prepara para ser professor de línguas - sem dúvida, uma atividade nobre, porém pouco valorizada em nosso estado...
4 - A grande novidade da UFRN, o Bacharelado em Ciência e Tecnologia (os alunos passam três anos, recebem um diploma superior e podem ir para o mercado, ou optar por diversas alternativas de engenharias, ou cursos da área de Exatas, obtendo um segundo diploma com mais dois anos de estudos) pretende atender uma demanda do mercado por profissionais com qualificação generalista. De fato há essa demanda? Pelas opções que oferece, inclusive a de definir a carreira mais tarde, você consideraria uma boa opção para quem está um pouco indeciso?
Acho uma excelente idéia. Faço coro com aqueles que acham que requerer de uma pessoa de 17 ou 18 anos, recém saída da adolescência, uma decisão segura a respeito de sua profissão um exagero. Nos três anos iniciais haverá tempo suficiente para amadurecer e fazer uma escolha mais consistente. Quanto à demanda, será necessário um trabalho bem feito de divulgação e conscientização das empresas, pois o mercado não está acostumado ao generalismo em área tecnológica.
5 - Os cursos de tecnologia, aliás, precisariam ser vistos com mais bon s olhos pelos candidatos?
Claro! Grande parte da aversão que alguns têm aos métodos quantitativos ou às “matérias de cálculo” são fruto de experiências mal sucedidas nos ensinos fundamental e médio. A área de tecnologia é muito promissora no Brasil. Em determinadas áreas como telecomunicações há vagas abertas a espera de profissionais competentes para preenche-las. Nos próximos anos áreas ligadas ao mercado de petróleo vão dar um salto significativo.
6 - Há explicação para o fato de um Estado no qual o Turismo é considerada a grande fábrica de empregos e de renda, contar com um curso na UFRN cuja demanda não passa de 2,38 por vaga (é desconhecido ainda, ou as pessoas querem trabalhar com turismo a partir de outras profissões)?
A situação dos turismólogos é um desafio. Nesse segmento há uma grande “invasão” de profissionais de outras formações ocupando espaços que, em tese, deveriam ser de profissionais de turismo. Outro aspecto que desestimula são os baixos salários praticados no setor. Considero que a grande revolução deve começar nos próprios cursos superiores de turismo, definindo e divulgando com clareza para o mercado e a sociedade o perfil de profissional que eles se propõem a formar, em que áreas ele vai atuar, que cargos pode ocupar e, o mais importante, o que as empresas do segmento têm a ganhar ao contrata-los.
7 - Apesar de os cursos de Direito terem se multiplicado pelas faculdades e universidades, particulares e públicas, do Rio Grande do Norte, a demanda continua alta (quase 10 por vaga). O grande número de formandos anualmente não deveria ter mudado esse interesse, ou realmente é ainda uma profissão promissora pelas várias alternativas de atuação que oferece?
Direito sempre será uma profissão promissora no Brasil. Num país de tanta injustiça, a promoção do direito nunca foi tão necessária! A grande questão que se coloca é: o curso de direito virou um produto que vende e muito bem! Ouvi de um professor de direito que grande parte de seus alunos não tem demonstrado perfil em termos de conhecimentos, habilidades e atitudes para atuar como um futuro magistrado, procurador, promotor, advogado e outros cargos da área. Os pífios resultados nos exames da OAB são uma prova de que a visão dele está correta...
8 - Os novos cursos de gestão (Políticas Públicas e Sistemas e Serviços de Saúde) tiveram demanda em torno de quatro por vaga. Eles representam uma nova visão em detrimento daquela de que os gestores não precisam de formação específica?
Eles suprirão uma grave carência dos tradicionais cursos de gestão. Eles simplesmente ignoram a administração pública. São 99% voltados para o universo das empresas privadas. Considero que os novos cursos de gestão chegaram em boa hora e que vão contribuir para apagar aos poucos a figura do burocrata encastelado no gabinete para dar lugar a uma administração pública dinâmica austera, eficiente e focada em resultados.
9 - A queda, pelo terceiro ano consecutivo, da demanda por Medicina representa uma possível tendência, ou parece ser algo apenas passageiro, já que a opção continua sendo a mais concorrida? Qual, na sua opinião, a perspectiva futura nessa área e nas demais profissões de Saúde (maior acesso da população aos serviços de saúde, ampliação de programas como o PSF)?
Acho a queda da demanda em medicina é meramente circunstancial e se deve ao aumento da oferta de vagas aqui no estado, pois não é só a UFRN que o oferece. A população está crescendo, juntamente com a expectativa de vida do brasileiro. Isso é garantia de alta demanda de trabalho para profissões da área de saúde, independente da continuidade de programas governamentais específicos.
10 - Independente para qual curso vá concorrer, que postura o aluno tem de manter até as provas e que também pode fazer a diferença quanto ao seu futuro profissional (dedicação, estabelecer metas, permitir-se momentos de lazer, focar seu objetivo, conhecer e preencher seus pontos fracos, etc)?
Acho que o aluno deve se espelhar na preparação dos atletas de ponta que são medalhistas olímpicos. As medalhas conquistadas e o choro ao recebe-las não vieram por acaso. São pessoas que investiram quatro anos num sonho. Sejam eles brasileiros ou não, considero que são um exemplo de disciplina, motivação e superação para os vestibulandos. Quem vai prestar vestibular deve enxergar esse exame como prioridade. Naturalmente não deve deixar de se divertir, nem abrir mão do convívio social com família e amigos, deixar de dormir adequadamente. Entretanto, sabemos que toda vitória tem um sabor mais doce, quando há luta e esforço para conseguir. Uma dica simples e prática é: a partir dos tópicos do Manual do Candidato, monte um cronograma de estudos com horários definidos. Vá riscando os itens à medida que você os revisar e já considerar estudados. Assim terá foco e irá realizar a prova consciente que estudou tudo que foi requerido.
11 - Quem for aprovado deve estar aberto à possibilidade de mudar de curso se o mercado modificar ou caso não se identifique com a profissão?
Mudar de curso não será o fim do mundo, nem um drama insuperável. As instituições contam com um procedimento chamado reingresso, que permite ao aluno realizar essa mudança caso haja vagas abertas. Um segundo vestibular é algo comum hoje em dia. É importante lembrarmos que é melhor desistir de uma opção quando se é estudante a investir numa carreira com a qual não se identifica e se tornar um profissional frustrado ou mesmo medíocre.
12 - Quem não for aprovado tem de buscar novos vestibulares, ou há alternativas (cursos técnicos, profissionalizantes) que podem lhe inserir no mercado de trabalho? Esses mesmos que não obtiverem sucesso devem ver o resultado como um estímulo para se dedicar mais?
Essa decisão vai depender da vocação e do tempo de carreira já transcorrido. Os primeiros insucessos não significam que o candidato deve mudar de opção automaticamente. Eles servem para agregar mais experiência em concursos e aumentar as chances de ser aprovado. Para aqueles que têm pressa em se inserir no mercado ou já fizeram muitas tentativas em torno de um mesmo curso, sem êxito, é melhor repensar e buscar outras opções. Conheço gente que desejava ardentemente um curso, não conseguiu e hoje declara-se feliz e realizado em outro.
13 - Há alguma profissão que você destaque para os próximos anos (as ligadas à área do petróleo, licenciaturas, informática, etc)?
Há áreas muito prósperas. Eu destacaria três: os cursos da área de gestão, as engenharias e os cursos da área de saúde.
14 - É importante o estudante saber que não será uma graduação que vai lhe garantir um futuro profissional promissor. O que ele tem de agregar a essa formação (cursos extras, idiomas, pós-graduação, etc)?
Falar em educação continuada deixou de ser mero discurso e virou um imperativo. Educação é um grande negócio no Brasil e no mundo. A dinâmica do mercado em várias áreas exige do profissional atualização e aprofundamento de suas competências. É um processo de renovação contínua. É como se a pessoa agregasse novos conhecimentos, enquanto apaga ou desaprende o que não serve mais. Esse processo não pára nunca! Por isso, ingressar em cursos de pós graduação, MBAs, idiomas, cursos de curta duração ou mesmo instigar a curiosidade intelectual é que vão garantir um espaço privilegiado ao profissional. O diploma é só o bilhete para entrar no “trem bala”. Agora o local em que vai sentar – 1ª , 2ª ou terceira classe, vai ser determinado pelas competências que ele demonstrar ao longo da carreira
15 - E dentro do curso, o que ele pode fazer para assegurar um lugar no mercado (conhecer pessoas, manter contato com os profissionais da área, estagiar o máximo possível, tentar se destacar na turma, participar de pesquisas)?
Depende do curso. Em cursos da área da saúde a dedicação aos estudos, a participação em pesquisas e o desempenho em atividades curriculares de cunho prático vão agregar decisivamente para a carreira. Nos demais cursos, realizar estágios pode ser a solução para começar a obter a tão exigida experiência prática. Sou um defensor ardoroso do estágio. Chega de estudantes teóricos! Outro aspecto que faz a diferença é a rede de relacionamentos ou network. Não basta ser bom. É preciso conhecer e ser conhecido por muita gente. Essa habilidade social poderá ser o ponto chave para abrir um bom espaço no mercado.